terça-feira, 11 de março de 2008

A menina e o vento

Era uma vez uma menina que adorava prender os momentos. Quando ela se sentia bem tristinha, com uma dor que atravessava o peito, corria no seu baú de tesouros e de lá tirava um lindo documento. Comtemplava corações desenhados, nomes grifados e isso bastava para que ela sentisse o amor que ali havia depositado. A verdade é que ela tinha um grande segredo: conseguia manter nos objetos os sentimentos que as pessoas desejavam.
Nos dias bem alegres, em que parece que o sol deixa de morar no céu para viver dentro da gente, ela tratava de pegar seu bauzinho e guardar a felicidade bem direitinho. Assim, ela teria bons sentimentos para sempre.
Até que um dia, quando andava à toa pela rua, ouviu dona Marica, a vizinha da frente, dizer que o vento leva e traz aqueles que amamos. Então a menina teve uma idéia: se ela podia prender os sentimentos, também podia amarrar esse tal de vento, assim ele não levaria ninguém que ela gostava.
Comprou um vidrinho, desses cheios de desenhos, e lá se foi, morro acima à procura do vento. Gritava, chamava e até cantava, mas nada do vento ventar.
Quando já estava desistindo do feito, sentiu uma brisa soprar. Os cabelos remexeram-se, formaram desenhos no ar. A brisa foi ficando mais forte e balançou galhos secos, folhas e flores. Logo o vento tratou de carregar sementes pelo ar. Notando a surpresa da menina, ele disse quase num sussuro: “preciso espalhar a vida por todos os cantos. Só assim a natureza cresce e as flores amanhecem”.
A menina se encantou com a profissão tão nobre do vento: distribuir sementes, conduzir nuvens, direcionar a chuva. E ela o amou com tal intensidade que queria se sentir balançada para sempre. Mas o vento não podia ficar. “É preciso seguir em frente”, ele dizia.
Com o coração pequenininho, ela chorou até seu vestido ficar encharcado de lágrimas. Como podia uma dor mais forte do que um joelho esfolado, um arranhão no braço ou um dedo quebrado? Foi aí que ela contou seu segredo: “olha vento, eu trouxe um vidrinho pra te aprisionar, mas como você precisa ventar não vou mais fazer isso”. O vento riu da idéia da menina e se encheu de ar até inchar de tanto orgulho. Claro que ela não podia prendê-lo, mas ele ficou feliz por ela decidir deixá-lo livre, mesmo que sentisse saudade.
“Olha menina, eu também tenho um segredo! É que eu sou o ar em movimento! E assim como o ar, eu também estou em toda parte. Cada vez que você sentir saudade lembre-se que estarei sempre por perto e nós nunca vamos nos separar”.
Surpresa, a menina sorriu. Não cabia em si de tanta felicidade. Gargalhou, rodopiou e cantou de braços abertos.
Agora não precisava de vidros, caixinhas nem cartinhas. Era só lembrar do vento para saber que logo ele estaria por perto. E para sempre.

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